quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Memórias de paladar


Um destes dias, numa das lojas onde nos são impingidos marcas, modelos e conceitos estrangeiros, foi-me dado a provar um vinho quente, muito típico, como bebida de inverno, na Suécia.
Provei. Provei com agrado, que o líquido quente, suavemente alcoólico e doce é bem agradável.
Contudo, logo abri aspas à designação “vinho” e imediatamente encontrei, na história das minhas papilas, uma vincada memória de paladares parecidos.
Apurei que a bebida tão característica do inverno sueco é um vinho de fermentação interrompida sem elevação de teor ou uma mistura de vinho e sumo de uva, que a tradição vinícola (de reconhecida excelência) se prepara para difundir no mercado nacional (tão ligado aos brilhantes exemplos do norte da Europa) e fazer vingar por cá esta tradição Oh!... Oh!... Oh!... tão genuinamente lusa como Oh!... Oh!... Oh!...
E busquei, na memória, quando, onde e como é que aquele paladar se terá marcado anteriormente em mim.
Associei e reconheci:
- VINHO QUENTE COM MEL.
Algures no passado de menino e moço transmontano, a tradição do meu povo me deu a conhecer o paladar que agora vinha a reencontrar com a marca tão certificadamente nórdica.
Segurei-me, fechei-me em copas (Como em jogo de “Sueca”?) e na primeira oportunidade, Noite de Natal, aqueci vinho (português e do bom) com mel da Serra de Montesinho (tão bom como o vinho, que eu não brinco em serviço) e dei a provar aos companheiros de ceia e noitada.
Sucesso estrondoso, com direito a aplauso e vivas, repetição e bis até a razão impor a moderação.
E a memória?
Essa…, a memória, foi meu pai que a recolocou no seu devido contexto, falando de que antigamente, em dias de matança do porco, se aqueciam assim as tripas e as almas de quem, com mãos geladas, regressava da ribeira com as ditas (do morto) lavadas.

A memória das papilas repôs-se e tudo combina.
Combina a tal mistela dos suecos com o frio da Suécia, mas combina comigo o paladar quente e doce de mel de urze e carqueja diluído no travo de bom maduro tinto, aquecido em púcaro de barro, nas brasas de uma lareira transmontana.
   
INCOMPARÁVEL.
Quanto vale a memória de um povo?

1 comentário:

Calos pimentel disse...

Aproveita o teu engenho e arte para passares, à memória futura, os costumes e atividades das quais tiveste a dita ou desdita de ainda de as teres conhecido.