sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Trilho de contrabando - 18 de Agosto

Pôr do sol em Avelanoso, 18-08-2011


Desta vez o trilho fez-se de Alcañices a Avelanoso. De noite, pela serra e, uma vez mais, foi um prazer fazer este caminho de contrabando e por ele tocar em leve agruras de outros tempos e outras gentes merecedoras de memória.
Conheço, de menino, algumas histórias ditas em surdina ou contadas em galhofa, de acordo com a circunstância, com o tempo, com os intervenientes … e soam-me, no ouvido, palavras não ditas nem escutadas, trocadas por outras que chegavam completamente para que todos se entendessem.
Lembro alcunhas … Lembro o meu Avô Pimentel. Lembro livros de assento e o cheiro da camioneta com a “Palmeira”no toldo de cinzento velho.
Lembro a “Tia Aurora”.
Vinte quilos de café, dentro de um saco de, apenas equipado com umas alças de modelo expedito e ocasional, seria obra! Um xaile atado à cintura acomodava a carga de quem, mais esclarecido, cuidava de acomodar o peso entre os ombros e as ancas.
Muito para cima de vinte quilómetros, por caminhos de incerto, de acordo com a fama dos “fiscais”, a adivinhação dos carabineiros, algumas rezas… e sorte, compunham a noite do fardo, acabada na seguinte, que só se fazia um pouco mais fácil por as pesetas serem mais leves que o café.
Houve filhos e netos que se calçaram no dia seguinte. E comeram… um mimo cansado e recortado no meio da “torta”.
Sorte era ter comprador fixo em povo perto! Sorte era adivinhar a “ronda”! Sorte era um acoito oportuno. O resto era suor.
Voltemos ao trilho da noite do dia 18. Onze quilómetros em ritmo de despreocupação e riso, de conversas e silêncios ocasionais afirmados sobre o esforço, podem parecer difíceis para corpos menos habituados à marcha, mas muito pouco parecidos com o passado lembrado. Ainda mais quando o passeio parece um entremeio que liga “galletas” à “jardineira” mais lusa.
Os puristas reviram os olhos! Contrabandistas dirão que falta perigo. Caminheiros, que falta ritmo.
Como sou essencialmente um passeador, há coisas que para mim tomam proporções diferentes. E faz todo o sentido que perceba o caminho mais que a noite, que conheça mais que sinta. E que veja! O caminho, a vereda, o vale, a “marra”… a serra!
Se veja!
Um destes dias vou pelo “luz-que-fusque”, para ver o pó e a pedra que piso, para ver o ar à minha volta e recriar na minha mente, esclarecidamente, os “caminhos” que outrora os contrabandistas terão percorrido.

2 comentários:

Toupeira Intermitente disse...

Parabés Pimentel acabas de me deliciar com esta prosa. O verdadeiro contrabandista de palavras.

Toupeira Intermitente disse...

Parabéns Pimentel, acabas de me deliciar com esta pequena prosa. És um verdadeiro contrabandista das palavras.